“Nunca me deparei com uma autuação fiscal tão ameaçadora à liberdade econômica”, diz Antonelli à Veja

Começa o bombardeio da Receita contra os artistas da Globo
Por Robson Bonin
Fonte: Revista Veja

Depois de passar meses vasculhando as relações financeiras da Globo com
as estrelas que integram o elenco artístico da emissora, a Receita Federal
deflagrou no fim de novembro uma das mais contundente...
O órgão aplica multas milionárias contra 12 celebridades da TV e do cinema
brasileiro por supostos “crimes contra a ordem tributária” cometidos em
“conluio” com a Globo a partir da chamada “pejotização”, modelo de
relação de trabalho que a própria Receita reconhece que é “comum no
país”, mas que, nesse caso, é usado até para fundamentar acusações graves
contra os globais e a emissora no MPF por “crimes contra a ordem
financeira”.
Segundo a Receita, ao recorrer ao modelo de pejotização, a emissora deixa
de arcar com custos formais nas relações trabalhistas enquanto o artista
paga menos imposto de renda. Vantajosa para as duas partes e, como disse
a Receita, comum no país, a prática agora configuraria crime na avaliação
dos auditores que estão atrás da Globo.
A fiscalização é mais um episódio da guerra aberta pelo presidente Jair
Bolsonaro contra a emissora tratada por ele como inimiga do governo. Em
um longo relatório de quase 70 páginas, no caso de uma famosa atriz de
novelas e do cinema nacional, o fisco aplica uma multa de 150% sobre os
valores fiscalizados. Os valores cobrados pela Receita na fiscalização
passam de 1,7 milhão de reais sobre um faturamento de pouco mais de 2
milhões de reais.
O tributarista Leonardo Antonelli, que defende os globais, afirma que a
ação da Receita configura “confisco tributário”, já que os valores cobrados
equivalem aos valores recebidos pelos artistas. “Alterando o seu próprio
entendimento praticado a décadas, a Receita resolveu desconsiderar todos
os recolhimentos tributários efetuados pelas pessoas jurídicas dos artistas
da Globo e cobrar o imposto de renda como se pessoa física fosse (27,5%),
acrescido de multa de 150% e juros Selic (44%). Na prática, se mantida a
autuação, o artista será obrigado a devolver tudo o que recebeu ao fisco:
um verdadeiro exemplo acadêmico de confisco”, afirma.
Para o advogado, a atuação da Receita não se sustenta juridicamente por
penalizar o contribuinte por uma prática aceita pelo órgão em governos
anteriores ao de Bolsonaro. “Em matéria tributária, o poder Judiciário tem
reiteradamente preservado o contribuinte que sofre autuação decorrente
de mudança de entendimento da Receita Federal”, diz Antonelli. “O setor
do entretenimento, jornalismo, esporte e tantos outros, a décadas, vem se
organizando através de empresas para gerir as carreiras, imagens e receitas
no Brasil e no mundo”, complementa.
Para o advogado, além de configurar uma perseguição aos artistas, o
bombardeio da Receita amplia a insegurança jurídica que afasta
investidores num país já famoso por um sistema tributário
esquizofrênico. “Em 30 anos de experiência em contencioso, nunca me
deparei com uma autuação fiscal tão ameaçadora da liberdade econômica”,
diz o advogado.